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Moz'Art

A Herança de Albino Mbié!

Gênero : Crônicas da sociedade
Contacto David Bamo
Principal país relacionado : Rúbrica : Música
Mês de lançamento : Agosto 2017
Publicado em : 08/02/2017
Fonte : David Bamo


Um dos nossos maiores triunfos, como povo, é a capacidade que temos de gerar grandes artistas nos mais diversos ramos. É incrível a agilidade com que assimilamos novos saberes e novos valores. Acho que um dos factores para tal proeza, de sermos cidadãos do mundo, é o desafio que os países com quem fazemos fronteira nos impõem. O facto de os países vizinhos, de Moçambique, terem o Inglês como língua oficial, faz emergir em nós alguma procura de aceitação e integração. Esta é uma das verdades que nos ajuda a emergir. Pode ser uma das fronteiras que conseguimos galgar. Ou sabemos, na verdade, viver e conviver com ela. Mas é uma fronteira especial porque ela nunca nos separou. Pelo contrário, ela nos excitou a compreender melhor os mistérios do outro ou dos outros. Tal realidade, que sempre será presente em nós, reflecte-se na relação que temos com os espaços, enquanto um conjunto de geografias.



 



O espaço geográfico, ainda, não constitui uma grande barreira para muitos artistas moçambicanos. Realmente, essa é uma herança de excessivas décadas. E acima de tudo, em termos musicais, é uma das manias dos nossos guitarristas. Digo guitarristas porque hoje me proponho a falar, de alguma forma, da grande vaga de tocadores de acordes que Moçambique gerou e continua gerá-los.



 



O mestre Fany fora, entre os anos 40 e 50, uma recomendação peculiar de estúdio na África do Sul ao serviço da His Masters Voice, acompanhando nomes como: Miriam Makeba, Dorothy Masuku, Dolly Rathebe entre outras estrelas da época. Em 1964, quando preso, viria a dar espaço ao Kid Munhamane, o rapaz escuro ou escurinho, mais conhecido por Alexandre Langa. Mas por aquelas terras, também brilhou um outro grande guitarrista moçambicano, Alexandre Jafete. Jafete, tocou e cantou Djone Kaya. Sem falar de Muthanda Feliciano Ngome e Benny Massinga. Porquê falo de todos estes baobás se o sujeito deste texto, indicado no título, é Albino Mbié?



 



Há toda uma necessidade de começarmos a discutir a História Cultural de Moçambique para compreendermos alguns acontecimentos que hoje parecem novidades. Compreender essa história ajudará os mais jovens e alguma parcela da sociedade. Ajudará a entender a relação que existe entre Moçambique e a guitarra, na perspectiva de afirmação no mundo. Sim, a guitarra. Este instrumento que nos coloca a falar com as nações. Um aparelho de cordas, que continua a abrir novos caminhos para Moçambique no mundo. É preciso conhecer a dimensão dos nossos ícones, o seu percurso e a sua relevância dentro e fora das nossas fronteiras. Isto faz-nos reflectir sobre a responsabilidade que temos em preservar o que devia ser o nosso maior orgulho, a nossa cultura.



 



Albino Mbié é herdeiro de toda essa herança de tocadores das coisas do nosso povo. As fábulas da terra mãe alimentam o processo criactivo deste que já não é só filho das escolas moçambicanas. Mas, também, fruto da Berklee College Of Music (Estados Unidos da América), uma das maiores academias de música no mundo, se não a maior. A Berklee tem dos mais rigorosos critérios de admissão dos seus candidatos. Ou seja, nessa academia ingressam os melhores. E Albino Mbié é um desses. Um dos melhores.



 



Na Berklee, Albino foi exposto as mais variadas culturas e influências sonoras. Isso lhe permite discutir a estética comum das canções moçambicanas, oferecendo-as novas fórmulas e linguagens. Por isso, hoje, o mundo conversa com a música do Mbié. Isto reflecte-se, por exemplo, pelo facto de ele tocar com uma banda composta por instrumentistas de vários continentes. A humanidade cruza-se, de alguma forma, nas frases que Mbié liberta com a sua guitarra e voz. A música de Mbino é um encontro entre as nações. Aqui reside a essência: o mundo fala com a nossa música justamente pela grandeza da nossa cultura e dos nossos artistas, dentro ou fora do nosso espaço pátrio; isso é graças, a abertura que Moçambique tem com o mundo.



 



Albino Mbié segue, por outro lado, a tradição maior do continente africano. Lança-se como um artista especial e de elevada qualidade. Aliás, Richard Bona fez questão de assinar o seu disco de estreia, Mozambican Dance, chamando atenção ao mundo sobre o registo sonoro, bastante característico da guitarra de Albino Mbié. A técnica muito distintiva que ele desenvolveu. Bona, vai mais longe, diz que não vai tardar para que o mundo conheça Mbié. Esta profecia, do baixista dos Camarões é de 2013. Hoje, 2017, o facto consuma-se. Mbino criou um projecto musical que reúne músicos virtuosos na sua forma de tocar o instrumento. Este projecto tem sido largamente reconhecido e explorado positivamente no globo. Por isso, precisamos que isso aconteça na terra natal do artista. Os nossos músicos, radicados na diáspora, têm que devolver a inspiração as suas fontes genuínas, ao povo moçambicano. Mas para isso, precisamos reforçar a nossa forma de valorizar o que estes, nossos compatriotas, fazem do outro lado do atlântico, como diria o mestre Ouri Pota. Devemos ganhar consciência da grandeza dos nossos artistas. Sim. São grandes os nossos músicos. Tal grandeza não é de hoje.



 



Hoje em dia ouvir Albino Mbié é percorrer pelos sons dos trovadores de Moçambique. É, também, descobrir Lionel Loueke. Há uma forma comum de compor que une estes dois. Albino e Loueke, ambos guitarristas africanos, parecem congénitos na sonoridade. Mbino faz da tradição um espaço aberto para criar, celebrar e viajar para qualquer destino. Tal faz de forma fictícia e realística. Perceber o andamento profundo que Mbié oferece a sua guitarra, é receber um lençol quente numa madrugada sofrida.



 



Do eterno admirador,



David Bamo



 



 



 



 

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