Mafalala: memórias e espaços de um lugar resulta de um trabalho conjunto entre investigadores portugueses e moçambicanos das áreas da literatura e do urbanismo, e da IVERCA, uma ONG moçambicana vocacionada para a promoção do turismo, cultura e meio ambiente. Cumprem-se assim as diretivas de uma investigação de responsabilidade civil pela transferência de conhecimento nos dois sentidos: da comunidade para a universidade e da universidade para a comunidade.
De forma mais detalhada pode também dizer-se que este livro conjuga o projeto da IVERCA com o projeto académico Patrimónios de Influência Portuguesa, sediado no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, que se dedica ao estudo e interpretação proactivos das heranças das culturas que se exprimem em língua portuguesa. No seio do Patrimónios desenvolveu-se durante três anos (maio de 2012 a setembro de 2015) o projeto De S. Paulo de Luanda a Luuanda, de Lourenço Marques a Maputo: capitais coloniais em tempos pós-coloniais, sob a coordenação dos organizadores deste livro, Margarida Calafate Ribeiro e Walter Rossa. O referido projeto contou com uma equipa multidisciplinar internacional a saber, para além dos coordenadores já mencionados: Roberto Vecchi (Universidade de Bolonha), PhillipRothwell (Universidade de Oxford), Francisco Noa (Universidade UniLurio, Nampula), Nuno Gonçalves (CES-UC), Fátima Mendonça (Universidade Eduardo Mondlane, Maputo) e Júlia Garraio (CES-UC) e a consultadoria de Júlio Carrilho (Universidade Eduardo Mondlane, Maputo) e de José Luandino Vieira (escritor angolano). O financiamento foi da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Os resultados do projeto contam com formas diversas de divulgação, estando em organização um outro livro com esse fim.
O projeto partiu do cruzamento de olhares do Urbanismo e dos Estudos Culturais sobre as cidades de Luanda e Maputo. Teve como espaço conceptual central o conceito de cidade como texto (Lévi-Strauss) ou palimpsesto de textos (André Corboz), e olhou a cidade como espaço de fundação da ocupação, como espaço colonial, como espaço de resistência e como espaço forjador das novas nações. No âmbito desta investigação, o espaço urbano e cultural da Mafalala foi estudado sobretudo pelos investigadores Nuno Simão Gonçalves, arquiteto, e Francisco Noa, especialista de literatura moçambicana e também antigo habitante do bairro. Enquanto o primeiro procedeu a uma investigação sobre as origens, a evolução e as especificidades do espaço urbano da Mafalala, o segundo debruçou-se sobre a presença deste bairro na literatura e na cultura moçambicana, bem como na construção da identidade do país. Francisco Noa através de um contributo mais pessoal a partir das suas memórias da Mafalala, juntamente com Fátima Mendonça, especialista da literatura moçambicana, ofereceram aos resultados do projeto as vozes poéticas da Mafalala.
No decorrer desta investigação no bairro, em 20 de dezembro de 2013 ocorreu o feliz encontro de investigadores do projeto (Margarida Calafate Ribeiro, Walter Rossa e Nuno Simão Gonçalves) com Rui e Ivan Laranjeira da IVERCA, associação cultural de turismo, cultura e meio ambiente. Este grupo inquieto procura, em regime de voluntariado, soluções para os problemas que a sua classe, em particular, e os jovens em geral enfrentam. Escolheram seguir o caminho do associativismo, como forma de contribuir para o desenvolvimento do bairro e do país, e têm a sua sede na Mafalala onde organizam roteiros pelo bairro para turistas, entre muitas outras atividades culturais (ver texto de Ivan Laranjeira).
A esse primeiro contato entre os investigadores e a IVERCA sucederam-se outros e, com eles, a possibilidade de realizar um trabalho inovador e necessário para aquela comunidade. Nestas reuniões concluiu-se da necessidade de a associação poder dispor de um instrumento com o registo do estudo do bairro e que, ao mesmo tempo, servisse de guia especializado a visitantes mais interessados. Delineou-se um esboço de possível livro e respetivo índice, contando com a participação de investigadores e de dois elementos da IVERCA. Ivan Laranjeira situa num primeiro texto o trabalho da IVERCA no bairro e em Moçambique, e Rui Laranjeira, professor, historiador local e ensaísta que há pouco publicou o primeiro estudo sobre a Marrabenta, dança que tem a sua origem na Mafalala, e que neste livro narra a história do bairro através da voz dos seus habitantes. A cargo de Fátima Mendonça e de Francisco Noa ficou a pujança poética, cultural e política da Mafalala e Nuno Simão Gonçalves, arquiteto e investigador moçambicano, desenvolveu o estudo sobre o lugar e o espaço urbano do bairro com o qual se fecha o livro.
Tendo em linha de conta o público alvo e a função do livro, entendemos ser fundamental dotá-lo de um aparato gráfico adequado, que tire partido de uma seleção feita entre a documentação recolhida de imagens atuais e de arquivo. Esta tarefa foi desenvolvida por Walter Rossa e Nuno Simão Gonçalves, cabendo ao último todo o crédito pela produção da cartografia com a qual se explica e se guia o leitor através do bairro. O design e composição gráfica são de Helena Rebelo.
Mafalala: memórias e espaços de um lugar é um livro escrito e composto a várias mãos por investigadores portugueses e moçambicanos que, em conjunto, sentiram a necessidade e a vontade de trabalhar e registar um assunto que, ambas as partes, de diferentes formas tinham estudado e conheciam. O diálogo, as transferências de conhecimentos e o superior interesse de assim servir a comunidade orientaram-nos para o livro que agora apresentamos.
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